Um edíficio chamado Flash Gordon ou será Arzak? ou será Ranxerox?
Em 1983 Saul Vilela foi chamado para fazer um grande edifício residencial em Uberlândia, sua terra, também conhecida como a Dallas brasileira. Um grande terreno, cheio de árvores, uma casa antiga para os padrões da cidade (muito nova). Em um gesto de total cordialidade chamou eu e Éolo Maia para participarmos do projeto.
Sempre respeitosos dos princípios projetuais professados pelos mestres, seguimos o primeiro deles que é a visita física ao terreno de onde poderiam emanar fluidos espirituais e outros mais sacanas sobre o futuro projeto. Tem muito arquiteto que chega no lugar e não acontece nada o que não foi nosso caso. Conhecido o terreno fomos atrás das necessidades “culturais” dos novos ricos da nossa Dallas e descobrimos que nesta época existiam por lá uns 200 ricos, ou que tinham dinheiro para largar suas mansões e ir morar numa torre. Disse torre, pois sim, era uma das primeiras condições de sucesso de um novo prédio era que fosse mais alto que o antecessor. Uma outra é que não fosse igual a nenhum outro e por aí iam se colocando as razões que poderiam ser utilizadas no marketing para convencer um destes ricos que já morava numa das outras e já construídas torres a mudar para esta.
Verificamos também que quase todos os outros prédios de ricos eram projetados por arquitetos de Ribeirão Preto e não faziam por menos: edifícios neocoloniais, neoclássicos, neomodernos numa profusão de estilos, revestimentos, apliques e etc.
Para tantos estilos, ou seja, para roubar ricos de tão diversas tipologias gráficas (existe?) só teríamos sucesso se nosso edifício contemplasse todas ou o máximo possível. Fizemos então assim, uma torre com 35 andares com uma fachada meio cega que se abria (pouco, já que era meio cega) para uma paisagem centro oeste (um pasto provavelmente) e uma fachada frontal onde o futuro morador ainda na planta escolhia seu estilo. Escolhidos os diversos sonhos, da casa de fazenda a cinderelas, cercamos esta possível e incrível miscelânea pseudocultural com uma grande e sinuosa malha quadrada, interrompida por um longo tubo chaminé pois ai também se come o churrasco com muita frequência (nem sempre as “janelas” gaúchas do Kunze regadas com as Corujas do Mika) e este feixe de chaminés terminava numa grande escultura do Amilcar de Castro por onde saiam tufos de cheirosa fumaça branca. Picanhas, cupins e alcatras.
Não deu certo, era muito, passou da conta penso eu e também tivemos o azar da filha do dono, no processo, formar-se em arquitetura e ela mesmo, juntando-se a um arquiteto mais experiente, fazer o prédio da família. Devem ter sido felizes os moradores e a arquiteta pois não teriam que explicar para cada um que chegasse para visitar o novo apartamento a história do edifício. Já eu, mesmo sem sua construção efetivada, já contei esta história mil vezes.
Mais à frente, insistimos, eu e Éolo, numa situação parecida num bairro de BH chamado Jardim América para um maluco arquiteto/construtor chamado Rogério Assunção que topou a parada e construiu um clone do Flash.
Outro dia vi um moderninho, todo de vidro na Av. dos Andradas, perto do Perrela (no pó) com um pomposo nome de Rossi Andradas Office. Parecidinho. Que bom, alguém anda lendo quadrinhos.